9 de maio de 2023. Tive uma indigestão antes do almoço ao saber da morte de Rita Lee. Na noite anterior uma das artistas mais corajosas, autênticas e engraçadas deixou este plano, que agora vai ficar mais careta, sem graça e sem sal. Não vou cumprir as funções básicas de um historiador nesta crônica, que seria escrever o histórico da cantora. Inclusive, ela deveria achar isso muito clichê. Vim dizer como sua música me afeta!
Anos atrás, quando mudei da casa da família para morar sozinho, o álbum Fruto Proibido (1975) foi minha trilha sonora. Ok, super clichê isso, mas fazer o quê? É a vida… “Um belo dia resolvi mudar …”.
Talvez eu consiga ser um pouco mais original ao dizer que as músicas de Rita Lee me inspiraram, junto com o processo de autoconhecimento da psicanálise, a bancar os sentimentos, desejos e ações. “Agora é hora de você assumir e sumir…”. Esse trecho de Ovelha Negra define bem o meu momento desde aquela época, de me permitir a coragem e a dignidade para acolher e aceitar minha personalidade, minhas escolhas e minhas histórias. Seja o que for, sou eu!
Seria mais um clichê dizer que isso é libertador, empoderador, etc., etc. e frases e mais frases de para-choque de caminhão… Nesse caso, ainda bem que estou longe disso, pois acho que que bancar-se não liberta nem dá poder. É apenas bancar-se, se reconhecer, se assumir e fugir de forças que não nos interessam mais ou não nos dizem respeito. Paradoxalmente, o peso de carregar o próprio mundo, nos próprios ombros – como uma espécie de Atlas da mitologia -, deixa a vida mais leve, mais sincera, descontraída e irreverente. E todas essas são características que observamos em Rita Lee e em suas músicas.
E com ela também aprendi a não me levar tão a sério em muitos momentos e a não levar tudo a ferro e fogo. Daí a, também, não levar (sempre) os outros e o mundo tão a sério. Isso é um passo natural e necessário para vivermos melhor.
Fica aqui a singela homenagem de um fã chorão e chato pacas (“Desculpe o auê…”) que, nas horas de morte, leva tudo muito a sério! Mas deixo isso para lá, pois amanhã o espírito de Rita Lee retornará ao meu corpo para dizer “Não é nada disso, alguém fez confusão…”.
E fica aqui também o melhor autoepitáfio desde os primórdios universais quando o Cosmos era movido apenas por sopros divinos: “Ela nunca foi um bom exemplo, mas era gente boa”.