Poema: Desterro

Vive dentro de mim uma solidão inconsolável

vasta planície cujos limites o medo não alcança

oásis desmapeado em um deserto impenetrável

onde os pés não deixam as pegadas das suas andanças

Sou o último ser vivo na Terra

derradeira alma encarnada debaixo do Céu

testemunha fiel do final das eras

falante solitário nas ruínas de Babel

E não há messias ou profeta

Bíblia ou Alcorão

batismo ou gozo asceta

que me conforte dessa solidão

Se minha pátria for eu mesmo

há muito vivo em exílio

Se minha origem me conduziu aos ermos

sou o filho pródigo do Desterro

Pois a casa que me viu nascer foi violada

e meus irmãos e irmãs foram levados

pelos mercadores de condenados

Nosso tambor silenciou

nossa cantiga foi calada

nossa savana desertou

e o banzo em nós fez morada

Procurei forças na memória dos ancestrais

entre os fôlegos de vida dos últimos viventes

Durmo angustiado entre os restos mortais

dos quartos já profanados dos descendentes

Vivo devorado por uma fome insaciável

animal feroz de garras e dentes afiados

mar aberto agitado por uma sede imensurável

porta-voz do mergulho aflito dos sentenciados

Sou o último ser vivo na Terra

derradeira alma encarnada debaixo do Céu

testemunha fiel do final das eras

falante solitário nas ruínas de Babel

Comentando o Poema Desterro

Com o poema “Desterro” conquistei o 3º lugar no Prêmio Marieta Jayme de Poesia, organizado pela União Literária Anapolina (ULA), com resultado divulgado durante a IV Feira Literária Anapolina (FLANA) em 20 de abril de 2022. Foi uma grande alegria e surpresa ter recebido esse prêmio! Então compartilho esse poema com vocês!

Divulgação do resultado aqui. Apareço a partir de 20min08s.

O início de tudo foi uma sensação de solidão em um desses dias complicados que todos temos. Lembro que ouvi muito a música Rocket Man do Elton John, que é sobre um astronauta solitário no espaço querendo voltar para casa. Explorei também o conceito do “último homem na Terra” presente em obras como Eu sou a lenda (1954) – conto de Richard Matheson – e em episódios da clássica série The Twilight Zone (1959-1964) ou Além da Imaginação aqui no Brasil. Também trabalhei com símbolos e imagens bíblicas e alcorânicas e, claro, com a experiência de diáspora africana que todos nós, negros e descendentes, sentimos, ainda mais vivendo em uma estrutura racista como a nossa.

Os versos do poema são duros e difíceis, mas espero que vocês gostem! Nas redes sociais adotei um design um pouco diferente do design dos posts sobre história e religião para marcar uma diferença e porque esse verde escuro musgo, sendo uma cor terral, remete a um lugar étnico, no meu caso, de negro.

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Como referenciar este conteúdo?

DAMASCENO, Thiago P. M. Desterro. História na Medina (Poemas), 04 mai. 2022.

Disponível em: https://historianamedina.com/poema-desterro 

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